
Trinta e trs minutos do segundo tempo de uma noite fria no Mineiro. O placar apontava goleada do Cruzeiro por 3 a 0 sobre o Atltico, na abertura do confronto pelas quartas de final da Copa do Brasil. Pelo Gigante da Pampulha, ecoava o grito de “Ol, ol, ol, ol” diante da troca de es do time celeste. Os mais de 40 mil cruzeirenses presentes, que vinham de vrios dias de agonia, vendo o clube ganhar as manchetes por episdios policiais e no esportivos, lavavam a alma. Mas todo esse clima s foi possvel graas a um jogador que esteve especialmente iluminado ontem: o atacante Pedro Rocha.
Dois minutos antes do “ol”, Pedro Rocha deixava o campo aplaudido. Do banco, o olhar do tcnico Mano Menezes tentava disfarar, em vo, uma dose de orgulho pessoal. O verdadeiro motivo que levou o treinador, horas antes, a optar por deixar o atacante Fred no banco e colocar Pedro Rocha de titular, num clssico permeado por tamanha tenso, pouqussimas pessoas sabem.
Tecnicamente, era fcil explicar. Apesar de mais experiente e com reconhecido faro de artilheiro, Fred amarga longo jejum de gols, e Pedro Rocha poderia ser o fato novo que a Raposa precisava para surpreender o Galo. Mas a calhou de o dia da partida amanhecer com a informao de que o clube celeste deve alguns milhes de reais a Fred e ao empresrio dele, Francis Melo. Se o dbito na conta tem a ver com a reserva, mais uma vez, pouqussimas pessoas sabem – e menos ainda seriam aquelas a itir a correlao entre os fatos.
De concreto que a cartada de Mano (da diretoria, de alguma entidade divina, sabe-se l...) foi a mais certeira do clssico. A mais decisiva. A chamada tacada de mestre. Pedro Rocha esteve no lugar e na hora certos para se aproveitar de erros fatais da defesa atleticana. O primeiro chute a gol do Cruzeiro no jogo foi dele, e foi parar no fundo das redes de Victor, que estava adiantado e no alcanou o torpedo lanado por Pedro Rocha, depois de belo drible em Elias.
Quatorze minutos mais tarde, aps um presente de Rver, que errou e com praticamente todo o time atleticano no ataque, Pedro Rocha saiu em disparada, ou por Victor e entregou a bola aucarada para Thiago Neves s empurrar para o gol. quela altura, os times e as torcidas ainda no sabiam, mas a partida estava decidida. Nessa jogada, o Cruzeiro sepultou qualquer chance de reao do Atltico. At sofrer o primeiro gol, o Galo estava slido em campo. Depois das duas bordoadas, sentiu nitidamente o golpe.
O mais impressionante que o time celeste definiu o clssico em lances pontuais. Foi mortal. Praticamente nas nicas vezes em que mandou a bola ao gol, ela entrou – para fazer justia s estatsticas, houve a cobrana de falta rasteira de Thiago Neves que o goleiro alvinegro defendeu. Na prtica, a Raposa no teve volume de jogo nem posse de bola que significasse um massacre sobre o adversrio. Contou, no entanto, com domnio emocional que lhe garantiu uma supremacia territorial determinante. J o Galo se tornou presa fcil. Tropeou nas prprias pernas. Foi uma equipe amarrada, sem encontrar sada. E o mentor intelectual dessa superioridade celeste foi Pedro Rocha. Robinho at faria o terceiro gol no segundo tempo, porm, todo o roteiro do clssico foi desenhado na primeira metade da partida.
Em novembro de 2018, Pedro Rocha ganhou uma esttua em Porto Alegre. Com 1,80m e 150kg, a escultura de bronze representa o heri do penta gremista na Copa do Brasil, conquistado em 2016, justamente em final contra o Atltico. O atacante fez dois gols contra o alvinegro na partida de ida da deciso, que terminou 3 a 1, no Mineiro. No foi o clube gacho quem encomendou a homenagem – a pea, confeccionada pelos artistas Vincius Vieira e Mario Caldeira, foi feita a pedido dos pais do jogador.
Pois talvez, agora, Pedro Rocha se candidate a uma esttua em Belo Horizonte. Pela atuao decisiva de ontem, por tudo o que ele proporcionou ao time, que precisava da vitria para sua afirmao, pelo alvio (ainda que temporrio) que garante diretoria do Cruzeiro num momento to turbulento, no seria exagero o atacante ter sua figura eternizada tambm em alguma rua da capital mineira.